segunda-feira, 25 de maio de 2009

Chamo este texto de ALEGORIA DA PRESENÇA DIVINA



Penso que tinha três ou quatro anos,
não sei bem ao certo.

O que me lembro com clareza é de uma rua,
caminho de casa.

Éramos apenas eu e meu pai andando juntos.

Às vezes, ele me colocava sobre seus ombros largos e
corria a passos firmes, incitando o vento a roçar mais forte na minha pele.

A sensação que eu tinha é que era tarde da noite.

A rua estava deserta.

Como companheiros, tínhamos apenas os postes e suas
luzes amenas apontando o rumo do lar.

Já de volta ao chão, vejo no rosto moreno de
meu pai um olhar maroto, de quem quer brincar,
aprontar uma travessura.

Sem aviso, ele passa a correr como um raio e em
segundos parece sumir por entre as bruma da noite.

Senti naqueles instantes pela primeira vez meu coração
pulsar mais forte, o sangue circular veloz por minhas
veias e medo, muito medo.

Medo de estar só, medo da escuridão, medo de não
chegar em casa.

E gritei. Gritei com todas as minhas forças, as lágrimas
correndo grossas sobre minha face.

Foram alguns poucos segundos. Para mim, o primeiro
contato com o desconhecido.

Logo pude ver meu pai de volta, estampando em seu
rosto um sorriso aberto, quase que uma gargalhada.

E senti seu abraço forte, seguro, protetor.

Já não me importava mais a distância, o tempo,
a escuridão, a rua deserta.

Sua presença era tudo.



Thomas Merton